Assistindo ao interessante
programa Planetas, na Cultura, vejo a história de uma jovem cientista que teve
o raro privilégio de visualizar as primeiras imagens do planeta Vênus.
Ela conta que recebeu as imagens
logo pela manhã e que imediatamente debruçou-se sobre elas e começou a procurar
por padrões semelhantes ao da Terra mas que não os encontrava.
A maior parte de sua entrevista,
bem como as de outros cientistas que participavam do programa, foi permeada com
colocações como as da cientista acima; todos procuravam identificar, seja nas
imagens de Vênus, seja na de outros planetas, padrões compatíveis com os do
nosso pequeno planeta.
Ora, de repente, isso me chamou a
atenção e fiquei ligeiramente incomodado com as entrevistas. Eram cientistas
falando; cientistas que estavam tendo a rara oportunidade de olhar para coisas
jamais vistas por olhos humanos, através de equipamentos da mais alta e
sofisticada tecnologia, e a primeira e mais frequente questão para eles era
encontrar padrões já conhecidos nossos, com os quais estamos familiarizados.
Onde fica o novo nisso? Onde fica
a busca por coisas jamais vistas se o filtro utilizado é o mesmo empregado para
olhar para o que já conhecemos?
É sabido que buscamos sempre por
padrões conhecidos e com os quais estamos acostumados. Para a maioria de nós,
meros mortais, isso foi fundamental para garantir que sobrevivêssemos ao longo
do tempo. Para cientistas, que devem ter em foco aquilo que habitualmente
passaria desapercebido para o cidadão comum, parece-me um contrassenso.
Porém, creio que já não deve mais
ser uma necessidade apenas dos cientistas a de olhar para o novo e encará-lo
como novo, como desconhecido. Todos nós podemos, e acredito que devemos,
exercitar essa capacidade, pois temos o potencial de fazê-lo.
Olhar para o novo, ou até então
desconhecido, resistindo à tentação de buscar por padrões já conhecidos, é
difícil e nos coloca frente a frente com medos e angústias que resistimos
fortemente a encarar. Porém, da mesma forma como para os cientistas acima, sem
esse olhar ficamos presos a enxergar apenas aquilo que estamos já habituados e
deixamos passar aquele pequeno ponto dissonante que pode abrir as portas para
um mundo inteiramente novo.
No campo da Psicanálise, não é
diferente. Ao ouvirmos, precisamos continuamente resistir a encontrar padrões;
precisamos ouvir cada indivíduo como se
fosse um novo e inexplorado planeta sobre o qual jamais havíamos colocado nossa
atenção.
Cada ser humano é um mundo e
somente a apreensão desse novo mundo despida de filtro preestabelecidos é que
proporcionará o verdadeiro trabalho de análise, em benefício do próprio
paciente.
Certamente não é tarefa fácil, como demonstra a experiência da cientista que vislumbrou Vênus. Mas, como diria
Churchill, é preciso “persistir, persistir e persistir”.